A Centralidade do trabalho no SUS
Teodoro iniciou sua palestra destacando a centralidade do trabalho para a construção e fortalecimento do SUS, enfatizando a importância histórica dessa questão, especialmente após a pandemia. Segundo o professor, o debate sobre o trabalho no SUS não deve ser visto como uma questão corporativa, mas como um elemento estruturante da saúde pública, essencial para garantir a qualidade e continuidade dos serviços oferecidos à população.
Ele alertou para o que chamou de “eclipse histórico” da valorização do trabalho no SUS, especialmente com a perda de força dos planos de carreira ao longo dos anos. A partir dos anos 2000, as alternativas gerenciais, como as terceirizações e as Organizações Sociais de Saúde (OSS), começaram a ganhar espaço, substituindo as políticas de valorização do trabalho que haviam sido introduzidas nas décadas anteriores. Esse movimento, segundo Teodoro, reflete uma “agenda adversária” que dificultou a implementação de um modelo coeso e estruturado de valorização dos profissionais da saúde.
Alternativas e diretrizes para a carreira no SUS
Em seguida, Teodoro apresentou as alternativas que têm sido formuladas para enfrentar os desafios do modelo atual. Ele mencionou experiências concretas, como a luta pelo piso nacional da enfermagem e a defesa dos direitos dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e Agente de Combate às Endemias (ACE), destacando essas iniciativas como vitórias parciais no cenário adverso de fragmentação e precarização do trabalho no SUS.
Teodoro também fez referência à emenda constitucional nº 120, aprovada em 2022, que dispões sobre a responsabilidade financeira da União, corresponsável pelo SUS, na política remuneratória e na valorização dos profissionais que exercem atividades de ACS e de ACE, que isenta o Fundo Nacional de Saúde do teto de contratação imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal, permitindo uma maior flexibilização nos gastos com o pessoal do SUS. Para ele, esse é um passo importante para reverter a histórica limitação orçamentária que afeta o financiamento da saúde, especialmente no nível municipal.
O trabalho no contexto político e econômico
Teodoro destacou a necessidade de compreender o trabalho no SUS dentro de um contexto mais amplo, que inclui as dificuldades do pacto federativo e a gestão pública no Brasil. Ele ressaltou que a fragmentação das políticas de pessoal, a alta rotatividade e a falta de planejamento regional comprometem a capacidade do SUS de expandir sua rede de serviços, o que, por sua vez, afeta diretamente a qualidade do atendimento à população.
Ele também abordou a questão do financiamento e da parceria público-privada, especialmente em relação às OSS. Teodoro criticou o modelo de gestão que prioriza a eficiência e os resultados em detrimento da estabilidade do trabalho e da qualidade do serviço prestado, alertando que isso pode gerar impactos negativos a longo prazo para o SUS.
O Trabalho como base para a Democracia e Cidadania
Para Teodoro, o trabalho no SUS é fundamental não apenas para a saúde, mas para a construção da cidadania e da democracia no Brasil. Ele observou que a crise do SUS é, em parte, uma crise do trabalho e que, sem uma rede de profissionais estável e bem remunerada, será impossível fortalecer o sistema de saúde pública no país.
A pandemia, segundo ele, mostrou a importância dos trabalhadores do SUS, que foram essenciais para enfrentar a crise sanitária, muitas vezes pagando o preço com suas próprias vidas. A valorização do trabalho no SUS, portanto, não deve ser vista apenas como uma questão técnica, mas como um ponto central para garantir a coesão social e a eficácia das políticas públicas de saúde.
Ao concluir sua palestra, Teodoro enfatizou a necessidade de reverter o processo de desvalorização do trabalho no SUS e de criar um modelo de carreira que seja sustentável e que tenha como base o reconhecimento e a estabilidade dos profissionais. Ele alertou para o risco de fragmentação das lutas dos trabalhadores da saúde, caso não haja uma coordenação eficaz a nível federal, e defendeu uma maior articulação entre os diversos níveis de governo para garantir um SUS forte e democrático.
Para saber mais sobre o seminário, acesse a análise das questões discutidas na série Em debate e assista à transmissão completa do evento.
Assista abaixo à palestra de Ronaldo Teodoro, transmitida ao vivo pelo canal da ENSP no YouTube, e confira sua apresentação aqui.